sexta-feira, 27 de março de 2009

A ASAE, A CONFRARIA, A SAÚDE PÚBLICA E A JUSTIÇA: A SENTENÇA

A ilustração data de 1980, é da autoria de José Manuel Silva e «refere-se» ao tempo em que a Fundação da Casa de Bragança tentou, nos Tribunais, silenciar a voz do Centro Cultural Popular Bento de Jesus Caraça, sócio nº 1 da Confraria.
Foi publicada no primeiro número do Jornal »Há Tanta Ideia Perdida», I Série, então propriedade da referida Associação Cultural.

O Sr. Juiz Francisco Mourato, do Tribunal de Redondo, leu, sem qualquer comentário, a «sua» Sentença, da qual destacamos as seguintes passagens.
Os destaques a itálico são de nossa responsabilidade.

«… Ou seja, para efeitos destes instrumentos comunitários, tal como se fez noutros domínios, adoptou-se um conceito lato de empresa não redutível à concepção que o Direito Comercial lhe confere, razão pela qual devemos entender que nos encontramos perante um conceito próprio do Direito Comunitário, nos termos do qual se incluem toda e qualquer organização de meios, dotados de personalidade jurídica, que possam desenvolver qualquer actividade que se relacione com a produção, transformação ou distribuição de géneros alimentícios, sendo para tal indiferente, se tal actividade é ou não prosseguida com finalidades lucrativas.
Assim entendido o conceito de «empresa», não restam dúvidas de que a associação arguida, porque se dedica, entre outras actividades, à produção e distribuição de pão, outrossim deve ser qualificada de «empresa», para estes efeitos…

Porém, resta ainda apreciar se a decisão de suspensão imediata da actividade de produção de pão, de que a associação arguida foi alvo pela autoridade administrativa, se mostra necessária, adequada e proporcional aos fins visados pelos referidos diplomas jurídicos.
Pela nossa parte, afigura-se-nos que tal questão axial, nestes autos, deve merecer resposta afirmativa, dado que entendemos que aquela medida cautelar de suspensão se mostra necessária, adequada e proporcional, a fim de se salvaguardar a Saúde Pública dos consumidores, como infra melhor se explicitará.
Com efeito, não se duvida que os produtos designados de «tradicionais» possuem um valor intrínseco elevado, devido não apenas à riqueza das suas propriedades (sabores, aromas, texturas) e equilíbrio nutricional, mas também devido ao facto de o seu processo de fabrico ser o resultado de centenas de anos de evolução de práticas ancestrais que contam com a experiência empírica de inúmeras gerações.
Contudo, nos dias de hoje, não basta o reconhecimento destas características para que estes produtos mereçam a confiança do consumidor.
Conquanto os produtos tradicionais apresentem características naturais que lhes conferem, por regra, um bom nível de segurança alimentar, esta deve continuar a assumir um papel de destaque obrigatório ao longo de toda a cadeia alimentar.
Ou seja, os bens jurídicos da Saúde Pública em geral e da Segurança e Higiene Alimentar em especial, reivindicam, cada vez mais, um efectivo controlo externo de todas as actividades de produção e/ou distribuição de géneros alimentícios destinados ao consumo humano.
Tendo presente estes objectivos que revestem claro interesse público e cuja prossecução importa tornar efectiva em prol de defesa da Saúde Pública dos Consumidores, deve entender-se que, não tendo a actividade panificadora desenvolvida pela associação arguida sido previamente controlada por uma entidade externa competente, cuja emissão de alvará de licença de utilização consistiria numa garantia de que aqueles bens jurídicos de Saúde Pública, Segurança e Higiene Alimentar estariam acautelados, se tornou necessária, adequada e proporcional, a decisão de suspender de imediato aquela actividade, em homenagem ao aqueloutro princípio basilar neste domínio, qual seja: o da precaução.
Com efeito, não se deve olvidar que para a cabal salvaguarda daqueles bens jurídicos, não se exige que ocorra uma lesão efectiva dos mesmos, bastando, para o efeito, que haja um perigo abstracto de lesão.
Por outro lado, deve outrossim dizer-se que não se vislumbra, como defende a associação arguida, que tal suspensão coerciva da actividade panificadora que vinha sendo desenvolvida por esta, acarrete para a associação arguida um prejuízo considerável, já que se apurou que esta actividade de produção de pão constituía apenas uma das formas de divulgação das qualidades do pão produzido de acordo com os métodos tradicionais, não estando, destarte, comprometida ou sequer postergada a actividade primeira da arguida, qual seja, a de divulgar e enaltecer as qualidades do pão produzido de acordo com métodos tradicionais.
Por tudo quanto se expôs, deve pois concluir-se pela manutenção da decisão decretada pela autoridade administrativa.»
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